Veja a primeira parte deste texto: A Formação do Conceito de Trindade
A importância dos Concílios da Igreja
Nesse contexto, como já abordamos, foram de suma importância os Concílios da Igreja, pois foi através deles, principalmente os primeiros, que foi definido o Conceito de Trindade. No primeiro concílio, o Concílio de Niceia no ano de 325, o tema principal foi a Cristologia, a propósito não só neste concilio, mas nos quatro primeiros, esteve em pauta este tema, o que fez com que fosse definido o conceito de trindade, esse 1º concílio foi convocado pelo imperador Constantino, exatamente na cidade em que ele passava suas férias, que era a cidade de Niceia.
Vamos fazer uma “pequena viagem”, principalmente entre os quatro primeiro Concílios. No entanto, poderíamos sintetizar em poucas palavras o que é abordado e definido “ao longo da história do cristianismo” quanto a definição de Trindade, como nos lembra Leonardo Boff Apud MIRANDA.
Alguns concílios, segundo o autor, foram importantes na formulação desta Doutrina. O símbolo de Nicéia (325) “Cremos em um só Deus pai onipotente… e em um só Senhor Jesus Cristo Filho de Deus… e no Espírito”; o símbolo Niceno-constantinopolitano (381) “Cremos em um só Deus, Pai todo-poderoso… e em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho unigênito de Deus… e no Espírito Santo; O símbolo “Quicumque” ou pseudo-atanasiano (430-500) “Há, consequentemente, um só Pai, não três pais; um só Filho, não três filhos; Um só Espírito, não três Espíritos”; o símbolo do concílio de Toledo (400) “Existe também o Espírito Paráclito, que não é nem o Pai nem o Filho, senão que procede do Pai e do Filho” e o de Florença (1431- 1447) “O Espírito santo procede eternamente do Pai e do Filho”, o IV Concílio de Latrão (1215) “Cremos firmemente e confessamos com simplicidade que é um só o verdadeiro Deus,… Pai, Filho e Espírito Santo. Três pessoas realmente e uma só essência”, dentre outros.[1]
Não obstante, daremos uma pincelada somente em alguns dos temas tratados nos quatro primeiros Concílios, como segue abaixo.
1º Concílio – o de Niceia – em 325
O concílio de Niceia foi convocado para resolver alguns problemas de desentendimentos de ordem conceitual que estava havendo, por exemplo, entre um presbítero da igreja de Alexandria chamado Ário, e o bispo desta cidade chamado Alexandre. Ário entra em confronto com o bispo Alexandre dizendo que este praticava o Modalismo[2], sendo que Alexandre não defendia essa tese.
O problema é que Ário – daí o termo Arianismo – negava a divindade de Jesus, para ele, Jesus teria sido criado, mas não seria da mesma Substância que Deus Pai. O Confronto estava dado e Alexandre convoca um Sínodo, que é algo mais local, e foi feito em Alexandria mesmo, no ano de 318, e evidentemente que condena as ideias de Ário, que não se contém, e neste confronto, Ário começa a divulgar suas ideias. E alguns bispos de outras regiões o apoiam, inclusive o bispo de Niceia. Um dos problemas foi que os bispos estavam divididos, alguns do lado do arianismo e outros do lado de Alexandre.
Essa problemática causa uma preocupação com o imperador que não queria ver o império se subdividindo, é bom lembrar que naquela época em pauta os bispos já tinham alguma participação significativa no império. Então, Constantino querendo resolver esse confronto e manter a unidade do império, convoca um Concílio Universal para unir os cristãos que estavam em desavença, Constantino esteve presente e teve como assessor teológico Eusébio de Cesareia. Interessante observar que há pouco tempo a igreja era perseguida por esse império, que agora, com outro imperador convertido ao cristianismo, os convoca para uma reunião dessa magnitude. A imensa maioria dos bispos que participaram desse concilio são exatamente do mundo oriental, do ocidente foram poucos bispos, de fato o problema que estava ocorrendo era mesmo no oriente.
Nesse Concílio a primeira decisão foi que somente os bispos poderiam fazer uso da palavra, e como Ário não era bispo, não poderia falar, também foi definido que o bispo de Alexandria seria o Patriarca do norte da África. Dessa maneira já se está direcionando um lado e um dos pontos de vista, e nesse momento é definido que Jesus é homoousios ao Pai, ou seja, Jesus é da mesma Substância que o Pai, então o que o Pai é, o filho é, se Deus Pai é eterno assim também O é o Filho, Ele é coeterno consubstancial ao Pai, eterno, criador, e não criado pois se Ele fosse criado seria uma criatura e não Deus.
O Credo de Niceia então é definido e só dois bispos não o assinam, de qualquer maneira o arianismo ainda teve repercussão durante algum tempo, mas como sabemos foi “eliminado” e prevaleceu até os nossos dias o que foi sendo definido nesse concílio e no próximo que vamos abordar agora, o Concílio de Constantinopla I.
2º Concílio – o de Constantinopla I – em 381
Em Constantinopla I é definida a divindade do Espírito Santo, este concílio como a maioria dos primeiros concílios, tinham como uma das principais pautas combater o que eles chamavam de heresias e, nesse contexto, iam definindo as doutrinas que, entre outras, vão dando as bases para definir a Trindade.
Nesse concílio de Constantinopla I um dos combatidos foi Apolinário, que dizia que Jesus não tinha um espírito humano, pois o mesmo foi substituído pelo logos o que é uma clara distinção entre corpo e alma tratada pela filosofia grega. O apolinarismo é, portanto, baseado no dualismo e afirmava que houve uma substituição da alma humana de Jesus por esse logos divino.
Convocado por Teodósio I, na capital da parte do império oriental, a propósito muitos pensam que foi o Constantino (de Roma) que fez o cristianismo como religião oficial do império, mas na verdade foi o Imperador Teodósio I quem o fez. Constantino de fato deixa de perseguir a igreja, mas Teodósio I é quem a oficializa como a religião do Estado.
Este concílio aprofunda o Credo de Niceia que se torna o Credo Niceno-Constantinopolitano, que com o tempo sofre alguns ajuste. Outro ponto a destacarmos desse concílio, além do combate ao apolinarismo, foi a declaração da Divindade do Espírito Santo, estava aí portanto definido e “fechado” o Conceito de Trindade. Este Concílio, também combatendo a heresia defendida por Macedônio I que é conhecida como macedonianismo ou pneumatomaquismo, negava a divindade do Espírito Santo, considerando-o uma criatura subordinada a Deus Pai e ao Filho Jesus Cristo. Podemos apresentar um resumo dessa fé trinitária segundo S. Gregório Nazianzeno, denominado “o Teólogo”, a qual o confia aos Catecúmenos de Constantinopla:
Antes de todas as coisas, conservai-me este bom depósito, pelo qual vivo e combato, com o qual quero morrer, que me faz suportar todos os males e desprezar todos os prazeres: refiro-me à profissão de fé no Pai e no Filho e no Espírito Santo. Eu vo-la confio hoje. É por ela que daqui a pouco vou mergulhar-vos na água e vos tirar dela. Eu vo-la dou como companheira e dona de toda a vossa vida. Dou-vos uma só Divindade e Poder, que existe Uma nos Três e que contém os Três de maneira distinta. Divindade sem diferença de substância ou de natureza, sem grau superior que eleve ou grau inferior que rebaixe… A infinita conaturalidade é de três infinitos. Cada um considerando em si mesmo é Deus todo inteiro… Deus os Três considerados juntos. Nem comecei a pensar na Unidade, e a Trindade me banha em seu esplendor. Nem comecei a pensar na Trindade, e a unidade toma conta de mim.[3]
A partir desses dois primeiros Concílios é definido um Credo, que a Igreja cristã, especialmente a Igreja Católica Apostólica Romana, o reza em datas especiais seguindo a liturgia e o rito abaixo:
Creio em um só Deus, Pai Todo-Poderoso, criador do céu e da terra, / de todas as coisas visíveis e invisíveis. / Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, / nascido do Pai antes de todos os séculos: Deus de Deus, luz da luz, / Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, / gerado, não criado, consubstancial ao Pai. / Por ele todas as coisas foram feitas. / E por nós, homens, e para nossa salvação, desceu dos céus:
(aqui todos se ajoelhem)
e se encarnou pelo Espírito Santo, / no seio da Virgem Maria, e se fez homem.
(aqui todos se levantem)Também por nós foi crucificado sob Pôncio Pilatos; / padeceu e foi sepultado. / Ressuscitou ao terceiro dia, / conforme as Escrituras, / e subiu aos céus, / onde está sentado à direita do Pai. / E de novo há de vir, / em sua glória, / para julgar os vivos e os mortos; / e o seu reino não terá fim. / Creio no Espírito Santo, / Senhor que dá a vida, / e procede do Pai e do Filho; / e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado: / ele que falou pelos profetas. / Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica. / Professo um só batismo para remissão dos pecados. / E espero a ressurreição dos mortos / e a vida do mundo que há de vir. – Amém.[4]
No Próximo e último tópico apresentamos um pouco das definições nos dois próximos concílios e tecemos nossas considerações finais e apresentamos a Bibliografia e Referências Bibliográficas.
[1] MIRANDA, Daniel Guanaes de. Leonardo Boff e João Calvino: diferentes perspectivas concernentes à Santíssima Trindade. Disponível em: https://www.monergismo.com/textos/jcalvino/Boff-Calvino-Trindade_Daniel-Leite.pdf /Acesso em: 17/03/2025. p. 5-6 do PDF.
[2] Modalismo – as três pessoas da trindade são vistas em três modos diferentes em que o mesmo Deus se revela, ou seja, Deus se apresentava uma hora como Deus Pai, outra como o Filho e a outra como o Espírito Santo.
[3] CATECISMO da Igreja Católica. São Paulo: Loyola, 2000. p. 77; CIC. 256.
[4] CATÓLICO Orante. Orações. Ocasiões Especiais. Credo Niceno-Constantinopolitano. Disponível em: https://www.catolicoorante.com.br/oracao.php?id=16 Acesso em: 22/03/2025.