Um quadro representando uma obra de arte. A estética mercantilizada na contemporaneidade.

A estética mercantilizada na contemporaneidade (1.5.1)

Continuando e concluindo esse texto...

Na contemporaneidade as obras e a estética passam a ser mercantilizadas em vários aspectos na sociedade, não só nas obras de arte, como sabemos, pois esta teve várias fases e sempre dependia de alguma maneira dos “investidores” para que ela pudesse existir. Houve a época que eram as religiões, outras que foram os governos, e agora é, em muitos casos, o valor de mercado gerado pelo capitalismo.

Conforme comenta Chaui (2005)

 

Para que a autonomia das artes viesse a acontecer foi preciso que o modo de produção capitalista dessacralizas-se o mundo e laicizasse toda a cultura, lançando todas as atividades humanas no mercado. Isso significou, porém, que livres do poder religioso e do poder político, os artistas se viram a braços com o poder econômico. Ao se livrarem do valor de culto, as obras de arte foram aprisionadas pelo valor de mercado. (p.274).

Comento agora nestes dois próximos tópicos, um pouco sobre a beleza estética tanto na humanidade quanto em produtos de consumo e sua mercantilização.
1.5.2. Nos seres humanos

 

Vimos recentemente nos noticiários, que uma “modelo” veio a falecer vítima de anorexia porque se julgava fora dos padrões estéticos em sua categoria. Ela já estava magérrima com seus cerca de 40 kg e 1,74 metros de altura, mas se acreditava fora das “medidas”. Isto nos mostra com tal clareza o quanto é inescrupuloso tais pensamentos com relação à estética humana e sua mercantilização, que é formada por diversos e diferentes grupos, cada qual com seus “valores” estéticos e interesses econômicos.
É interessante relembrarmos que houve épocas que o padrão estético e de beleza estava nas “gordinhas”. Isto nos mostra que os valores humanos quanto à sua beleza variam com a época, e sabemos que dependem também da cultura de um certo povo, encontramos diversas culturas com padrões que, nós ocidentais, chamaríamos de esdrúxulos.
Mas o principal ponto que gostaria de destacar, é que na contemporaneidade se vê com toda a facilidade gente e mais gente. Humanos e mais humanos que entram em cirurgias e mais cirurgias estéticas em busca de uma perfeição apolínea. Não pretendo tecer opiniões quanto a isto, mas acho que a “indústria da beleza” está bem satisfeita, e a cada dia, se lançam mais e mais cosméticos em busca dessa beleza… tanto quanto novas e mirabolantes “técnicas” de se fabricar esta tão esperada beleza estética humana. Esses humanos…. (!)
1.5.3. Nos produtos de bens de consumo

 

A mercantilização da estética se dá em vários aspectos da sociedade contemporânea como dissemos, não só na arte por essência, mas em diversos produtos que são feitos de maneiras a “encantar” este povo, tanto quanto nos produtos abstratos repassados pela televisão. Sejam eles programas inúteis, ou até mesmo jornalísticos disfarçados de úteis. Como diz Chaui a realidade parece fictícia e a ficção parece realidade.
 
Precisamos aqui fazer uma pequena distinção entre desejos e necessidades, esta é algo oriundo nos seres humanos, tais como: necessidade de alimento, locomoção, e comunicação por exemplo, mas para satisfazê-las não precisamos comer um caviar ou um pescado que custa centenas de euros em um restaurante francês, não precisamos de um automóvel de ultima geração para nos locomover, e para nos comunicar não precisamos de um celular ultramoderno, que o falar através dele, é o menos importante tão requintado que é este aparelhinho de nossos dias.
Tudo isto são desejos criados por uma “indústria cultural” mercantilizada, em que se usa da estética e da tecnologia, para cada vez mais aprimorar o “embelezamento” dos produtos de consumo. Porém essas técnicas também vieram a facilitar a vida do homem moderno e do contemporâneo, não se pode negar a facilidade que se alcançou e se alcança com tudo isto. Mas é preciso se separar e distinguir o que é belo do que é simplesmente útil. E foi isto que começou a ocorrer desde o final do século XIX e durante o século XX. Mas muitas vezes podemos ver nos dias de hoje, e em todo lugar, coisas que unem o belo ao útil. Chaui (2005) diz
Os objetos produzidos com base no design indicam que foram concebidos com a preocupação de que, além de úteis, também sejam belos. No entanto, é possível distinguir entre esses objetos técnicos e as obras de arte.

A diferença entre obra de arte e os objetos técnicos está em suas finalidades: a obra de arte é expressiva, o objeto técnico, ainda que belo, é funcional. (p.277).

Como nos relembra Chaui, também é importante salientar que “as artes são vistas como trabalho da expressão e mostram que, desde que surgiram pela primeira vez, foram inseparáveis da ciência e da técnica.” (p.276).
Mas agora a aura é perdida através da reprodução técnica que, como nos diz Chaui, “permite a existência do objeto artístico em série e que, em certos casos, como na fotografia, no disco e no cinema, torna impossível distinguir entre o original e a cópia, isto é, desfaz as próprias idéias de original e cópia.” (p.279).
Isto ocorre também com todos os objetos de consumo que poderíamos chamar de “obras de arte vulgarizadas ou massificadas”, pois são o resultado de uma comoção mundial – refiro-me ao mundo ocidental capitalista – ao belo e útil, muitas vezes com até mais beleza do que utilidade propriamente dita, mas que emocionam, que apaixonam as pessoas a adquirirem tais produtos dotados de tanta beleza e tecnologia que na realidade tornam-se objetos para serem contemplados admirados e muitas vezes pouco utilizados em sua plena totalidade.
Estes produtos são feitos em série para as pessoas que os adquirem ou seja a massa. Como nos diz Chaui massa “É um agregado sem forma, sem rosto, sem identidade e sem pleno direito à cultura” (p.291). Ou seja pensa-se estar adquirindo este ou aquele produto para se sentir dentro de um grupo social e de certa maneira ser diferente e personalizado, mas na verdade se é massa, ou seja é coisa que não se distingue. É a massa “inculta”. Pois a indústria cultural, introduz a divisão social entre elite “culta” e esta massa “inculta”.
Em consequência temos a ideia de mass media ou os meio de massa que são utilizadas pela televisão e pelos diversos meios de comunicação. A mídia como é usada no Brasil, é o moldador desta massa. Se há massa é necessário “moldá-la”.
Como há pessoas para adquirem tantos produtos e cada vez mais produtos são lançados e a indústria não pode parar de produzir – pois faz parte da engrenagem capitalista – não há o interesse em se fabricar produtos duradouros, ao contrário estamos na era dos produtos descartáveis. Estamos na sociedade pós-industrial ou pós-moderna, é a “sociedade do descarte” como nos diz Chaui. Para fazer um trocadilho com o nome do nosso grande pensador que talvez tenha dado início a todo um modernismo que vem desaguar onde nos encontramos hoje, ou seja, Descartes; pois bem, será que ele poderia imaginar o que viria a ocorrer no século XX ou XXI, e o sentido desse trocadilho em português? O filósofo Descartes e a “sociedade do descarte”.(?)
Tudo é produzido para uso temporário e imediato, não se vende mais o produto necessário e útil, mas os desejos criados pela mídia. Os produtos são mais “belos” do que úteis. Mais desejado pelo inventivo status que apresentam, como sucesso, prosperidade, segurança, juventude, beleza pessoal, atração sexual, do que pela real necessidade do sujeito que aqui não é sujeito é massa.
O marketing portanto elabora a criação dos desejos nesta massa, eticamente ele deveria identificar a necessidade e os desejos das pessoas e ai sim criar produtos para satisfazer esta necessidade e estes desejos. Assim na verdade o que temos são indivíduos que se tornam produtos. Vejamos e pensemos o tanto de coisas que carregamos quando saímos para trabalhar e até mesmo para o lazer, por que precisamos de tantas coisas? E o pior, tem que ser de tal marca.
A imagem passa a nos perseguir. Como somos mercadorias ambulantes, como nos diz Chaui (2005)
A propaganda passa a estimular imagens de indivíduos vencedores na competição instituída pelo mercado de trabalho: roupas, calçados, bolsas e pastas de grife, sabonetes, perfumes e desodorantes que sugerem requinte e glamour, cosméticos de marcas famosas, etc., passam a constituir o próprio corpo do individuo, formam sua imagem como uma espécie de segunda natureza ou de máscara colada em sua pele. (p.295).

É aí também que se tem a ideia de dividir a sociedade em classes sócias e os programas de mídia, radio, televisão, jornal, revistas entre outros passem a programar seus horários e interesses de acordo com os patrocinadores e os vendedores destes “produtos” nos dois sentidos: tanto os produtos fabricados no próprio sujeito como os para pôr neste produto fabricado chamado “sujeito”. De acordo com seus interesses.
Como nos diz Chaui, nós precisamos ser mantidos infantis e desta forma mais desejos de satisfações constantes, em outras palavras, precisamos toda hora de uma “balinha” de um docinho como crianças insaciáveis e pior sem maturidade. Não é interessante que reflitamos, que tenhamos críticas.
 
Diferentemente do que a obra de arte, que nos faz refletir, pois é necessário um trabalho sensorial para compreendê-la, amá-la, criticá-la, nos produtos industriais em série e condicionados em nossa mente não com seus “valores” intrínsecos mas seu “valor” de imagem, não é necessário nenhum esforço. É sem dúvida mais fácil se alcançar os objetivos da mídia desta maneira.
Como comenta Chaui (2005)
 
Como os meios de comunicação nos infantilizam, diminuem nossa atenção e capacidade de pensamento, invertem realidade e ficção e prometem, por intermédio da publicidade, colocar a felicidade imediatamente ao alcance de nossas mãos, acabam nos transformando num público dócil e passivo. (p.299)

Entendemos assim porque produtos e mais produtos nos fascinam tanto. Diferentemente de obras de arte sublimes e que exigem de nossa mente tanto esforço para compreendê-la, pois como somos doutrinados ou adestrados para de tal forma não entendê-la, ou não se interessar por ela, será que precisamos, portanto, nos libertar desta caverna, como alegoricamente colocou Platão?
 
1.6. Comentários finais

 

Fizemos uma pequena viagem no mundo da arte e da estética… passamos por alguns períodos e fases deste mundo.
Como vimos atravessamos de um período das obras religiosas, às políticas e agora temos as obras ou produtos mercantilizados – como procuramos enfatizar – pautado na estética e no design, e nos produtos ou programas inventados pela mídia televisiva.
Ninguém nos ensina a ver, diferentemente de outros aprendizados como a ouvir e falar por exemplo. A “ver”, ninguém acha necessário ensinar, será que isso está certo? Ou nós precisaríamos aprender a ver? E assim talvez veríamos e distinguiríamos o que é arte do que é puramente produção para simples mercantilização, ou pior, manipulação.
Estamos tão envolvidos e dentro desta “obra” que na verdade esquecemos que somos uma massa e somos modelados para fazer parte desta obra, embora não consigamos perceber isto, e isto se justifica a partir do momento que, como estamos dentro, não podemos ver, pois seria necessário que saíssemos de dentro dela para olhar de fora. É como querer fotografar o planeta Terra estando aqui no chão, não é possível! Precisamos ir ao espaço para vê-la por completo…
Seria então interessante desapegarmo-nos um pouco desta funesta “obra” em que estamos envolvidos e olhando de fora nos libertar da caverna mercantilista na qual estamos presos e enclausurados.
 

Poderíamos dizer para finalizar que devemos fazer da nossa vida uma obra de arte e não da arte mercantilizada em produtos e serviços a nossa vida.

Abraços do Benito Pepe

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E BIBLIOGRAFIA

BELTRÃO, Maria da Conceição de Moraes Coutinho. Ensaio de arqueologia: uma abordagem transdisciplinar. 1.ed. Rio de Janeiro: ZIT Gráfica e editora, 2000, 184p.

BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de filosofia. 1.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997, 437p.

CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. 13.ed. São Paulo: Ática, 2005, 424p.

__________. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles, volume 1. 2.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, 539p.

ENCICLOPÉDIA, Barsa. Rio de Janeiro – São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações, 1994. V. 7, p.184-186.

______________, Mirador Internacional. Rio de Janeiro – São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações, 1994. V. 8, p.4212-4218.

JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. 4.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006, 309p.

MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. 9.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005, 298p.

KANT, Immanuel. Textos seletos. 3.ed. Petrópolis: Vozes, 2005, 107p.

 

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